Parte I
"Doctor, doctor
What is wrong with me?
This supermarket life is getting long"
Parte II (Ainda mais distante)
Eu estou preso em uma jaula escura, e as cortinas não se ajustam ao meu querer de abri-las.
Por dentro, o imenso vago. Vago como ruas largas, em que os automóveis já não passam mais. Essa cidade abandonada. Usei de toda a minha engenharia para fazer-me melhor, pra fazer-te melhor comigo. A construção desmoronou.
O quarto escuro, de cortinas empoeiradas que já não podem ser abertas. Os ferrolhos da porta estão enferrujados, as persianas estão desintegradas. Presas por fios de teias apenas.
Tecidas as mãos, como num cobertor sufocante, eu estou/sou um casulo de proporções desajustas. Meus ouvidos escutam os clamores, meus olhos vêem, lacrimejando, chorando. Eu não sou mais o objeto do desejo.
Parte III (Desejoinveja)
Risos e faces bonitinhas, caminhamos de mãos dadas entre os outros. Trocamos carinhos, apertos e beijinhos. Falsa felicidade, vida de plástico. Sua maquiagem começou a borrar. É tarde, querida, é tarde.
Risco a pedra, faz-se o fogo, Abençoe-nos, Deus! Meu cigarro está aceso novamente. Com a outra mão, entrelaço seu lado. Discretamente, beliscamo-nos, destruímo-nos, e ninguém está percebendo esse jogo de farpas maldito.
A queda é inevitável, estamos presos pela nossa (má) vontade, pendurados pelo lado de fora da janela. É questão de tempo. Você me empurrou, eu permiti. Eu não te segurei, você não se importou. Pouco a pouco nos colocamos um ao outro nesse abismo.
Pedras de Coca-Cola em meu copo de naftalina, quis me envenenar como à sua própria vida de desgostos. Sangra-me as gengivas, parece que estou perecendo? Longe do resto, seguros (?) em nossa morada interior, a guerra se inicia.
Não nos resta mais coração, não nos resta mais paixão. De seu corpo, apenas o desejo sistemático, transformado em inveja, em raiva. Sugo-te todos os fluidos, estou me tornando mais forte. Seco, e vejo-te seco, aqui à minha frente. Estás enrugado. O que já foi minha outra metade, minha terra-firme? Estou sentado confortavelmente assistindo ao seu desespero.
Empurro-te da janela. Eu não sou mais o objeto do desejo. A queda é inevitável.
A construção desmoronou.
[Parte I - trecho de AMUSED TO DEATH, Roger Waters, 1992]
Um comentário:
lindo... saudade se cuida e cuidado mesmo viu bj
Postar um comentário