26 de maio de 2011

Alegorias

Quando as nuvens cobriram a maior parte do horizonte, estava anunciado o destino do resto da tarde. Chuva. Daí a pouco a vista era esbranquiçada, pálida como suas mãos. Dividiam-se em duas partes. A primeira, chuvosa, era um manto branco delicadamente ali depositado. Mesmo as altas torres de telefonia ficavam tímidas em meio àquele cenário – mal se via seus espectrais corpos projetados. A segunda parte eram os campos pra cá dessa cortina. Embora não houvesse qualquer evidência espacial de divisão, eram como se uma cena se tivesse colocada sobreposta à outra. Não se tinha sinais de água caindo e era bastante límpida a imagem das plantações, diversas elas, umas mais verdes e outras menos. [IP²] Hortaliças, milho e alguns punhados de pés de café eram facilmente distinguíveis. E ainda havia as casinhas simples, cunhadas com tijolos furados e sem acabamento de pintura.

[IP¹]

Não demorou para que a noite chegasse, empunhando majestoso manto vermelho, excessivamente cravejado de brilhantes estrelas. Tingindo de negro a terra em que passeava, era agora impossível enxergar. A escuridão tomou conta de meus olhos; não ouço, não sinto, não observo – pronunciava um profeta de inclinações misteriosas. Uma íntegra fileira de cem postes foi assim, em ordem progressiva, mas atemporalmente determinada, se apagando. Era uma reverência respeitosa à passagem do manto, do sinal de concordância em prol da majestade que ele representava.

Ele assistiu a tudo isso, calado. Fez o sinal da cruz e se levantou. Na Rua dos Iluminados, onde a luz havia por setecentas vezes sido dinamitada, pôs-se a levitar desapercebidamente. Trajava um chapéu branco com enfeites dourados e um óculos escuro extravasando sua personalidade introspectiva. De deus dedos pontiagudos gotejava óleo viscoso e frio.

Não há tempo que não seja intransponível, não há lugar determinado para o possível. Não há cura para as dores não perdoadas, não há cura para as feridas ainda abertas. Os eventos progridem em alta rotação.



[Índice de Produção¹/ inserir] Café e tabaco lhe faziam a cabeça naquele momento. Nada mais existia, nada mais importava. Uma xícara de porcelana branca estava depositada sobre um pires azul. Em meio à fumaça, revelava-se o cinzeiro. Prateado e pesado. Nada mais importava. Fora a tarde que findava, nada mais existia.

[Índice de Produção²/ substituir] Sem sinais de água caindo, a imagem das diversas plantações, umas mais verdes e outras menos, era bastante límpida.

Um comentário:

Anônimo disse...

Conheço o lugar da foto. E que beleza de texto!
Um beijo, rapaz.
M.