Esta é
uma declaração de amor que envolve cigarros, escuridão, ar fresco,
folhagens molhadas e, quem sabe, uma correspondência, embora eu não
acredite nela.
Como não
te vou entregar pessoalmente isto, é capaz que nunca você a veja.
Como não vou bradá-la por praças e em saraus literários (ai!,
pretensão minha, ai!), é capaz que dela você jamais tome
conhecimento. Não me importo. Joguei pelo universo as sementes deste
amor tão profundo e tão impossível, espalhei energias pelos quatro
cantos, sou a irradiação do amor.
Como não
te vou ver dormir, como não te vou tocar a face enquanto ressona,
provavelmente você não poderá sentir o carinho imenso que tenho
aqui, guardado em mim. Este carinho que floresce a cada dia porque
dele cuido muito bem, e que jamais fermenta porque entre nós não há
um risco sequer de desentendimentos. Esta compaixão que, eu sei, é
mútua, ainda que eu não possa dela provar agora. Não me importo.
Como não
estou presente em suas realizações mais recentes, não te posso
abrir um sorriso e esperar que venha tudo ao meu ouvido, e nem te
posso contemplar a face rosada enquanto conta, com empolgação, suas
descobertas e seus êxitos. Mas deles sei, deles todos, porque entre
mim e ti há uma conexão cósmica, uma força poderosa e que, sendo
universal, não é impedida pela distância, seja ela física ou de
pensamentos. E sei que, ainda que eu não pense em ti todos os dias,
sua imagem não se distancia de meu Eu. E nem se distancia do seu a minha. Eu
sei disso, e por isso não me importo.
Como em
seus acordares diários, às vezes difíceis, às vezes esplêndidos,
não te estou acompanhando, não posso provar do beijo seu, que tem
sabor de mel e é forte como conhaque. Mas embora eu esteja longe da
sua companhia agora, eu guardo no meu íntimo este sabor adocicado do
amor que já tive e ainda tenho de ti. E por isso não me importo. Eu
tenho em mim o melhor de ti, e como um bom amante e o apaixonado
incorrigível que sou, você sabe, jamais deixo que seja subjugada
essa lembrança.
Como na
alta madrugada não te posso visitar, subindo sorrateiramente as
escadas do apartamento seu, acabo por fumar sozinho o último cigarro
da noite ao invés de trocar com você suspiros eclipsados por luz e
fumaça. E não te posso, portanto, fazer comparações com as coisas
que vivi e as que viveremos ainda. Mas não me importo, com tudo isso
e apesar de tudo, não me importo. Porque ainda que eu não seja, por
nem um dia sequer, correspondido, vivo este amor em mim. Este amor
que é maior que os troncos das árvores em que já escoramos as
costas em outras tardes, que é mais gostoso que as risadas que já
demos ao telefone. E, quem sabe, as forças cósmicas não te trarão
um dia à minha porta, num belo sábado de manhã?
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