29 de outubro de 2010

Calmaria

Passada a dor do primeiro momento, ele suspirou. Não era como antes, havia agora uma barreira entre todo o resto. As cores se desvaneciam, o céu era enegrecido. Sempre o fora? Não.

Passada a dor primeira, as gotas de chuva caíram de suas pálpebras. Eram chuva realmente? A mão, precisa e firme, deslizava errante pelo corrimão, enquanto os pés subiam e desciam, galgando gradativa e descendentemente os degraus. Abaixo, sua visão era limitada. Estavam encharcados os olhos, ou ele simplesmente não queria ver? Queria ele ver, mas não via porque os olhos estavam encharcados, e ele não se deixava admitir? Perguntas dispersas...

Elevou a cabeça à altura da janela. O vidro estava respingado das gotas, as árvores balançavam com o vento forte. Lá fora era uma tormenta, mas aqui, bem aqui dentro, era a. Como se todos os eclipses começassem a pulsar com força, jorrava de dentro uma indignação desesperadora.

Acalmou-se, acendeu um cigarro, deixou limpar-se pela fumaça. As pontas achatadas dos dedos batucavam com desarmonia a superfície da mesa de madeira. Era mais ou menos assim o fim das eras? Essas eras inteiramente humanas, inteiramente internas. Ele era todo melancolia.

Passada a dor do primeiro momento, clamava-se por reflexão, e a calmaria não tardou a vir. Dias depois, o sol brilharia através das cortinas. Dias depois, ele as arrancaria com força, e o sol se voltaria com glória para sua face. Iluminara-se, como há muito tempo não se via. Radiante, galgou as escadas da satisfação; elegante, pisou firme seu terreno conquistado. Os enigmas permanecem, os mapas estão todos aí, camuflados nas paredes, enterrados nos cruzamentos das duas consciências. Ele era todo esperança.
 
 

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