[N.A.] Estou sinceramente
obcecado com o silêncio dentro de minha cabeça. Ouço distante e
vejo longe, revelam-se fantasmas e flores que estavam cobertos pelos
destroços.
Pego de uma toalha
pois precisava limpar minha face lambuzada, arrasada. Mas nem tanto.
Não me quebraram os pés ou pernas, e embora um tanto quanto manco,
saio e olho, com olhos curiosos, para cima. Tormenta interminável,
céus nebulosos, atmosfera ríspida. Tudo havia passado.
Sobraram cicatrizes
em meu rosto, cigarros mal terminados no cinzeiro e um resquício de
perfume que, se um dia já me alegrou as manhãs, agora espero
extirpar com a luz forte que invade as janelas e que desce suntuosa
pelo teto. Há luz em minha expressão.
Estive calado por
tempos intermináveis, que só podiam ser verificados em meus olhos
outrora úmidos e vazios. Como numa tumba, passei o que aqui dentro
foram eras entoando cânticos a quem, quem?, não os poderia ouvir. E
se estava em minhas mãos, em todo o tempo, a chave para inverter
esse sarcófago, faltou-me tato para manuseá-la.
De noite, olho-me no
espelho. O que vejo é resultado da falta de uma digna consideração
sobre mim mesmo? Desfiz-me já das pulseiras, dos colares, dos anéis.
Quero-me nu, completamente, de todas as ataduras que carreguei. Sem o
peso, sem o temor, facilmente saem sorrisos de lábios ainda muito
bem conservados, que guardam-se para o beijo no próximo cigarro, e
do outro que ainda vem.
E o sangue que
escorreu da face agora cicatrizada, para onde foi? Quando ponho-me
sobre os prédios, abraçado às minhas próprias pernas dobradas, em
diálogo com a fria neblina da madrugada, ainda não encontro os
vestígios que deveriam ter riscado o chão tanto quanto o fizeram ao
redor dos meus olhos. Permanecerá, portanto, apenas a minha última
afirmação, quer seja somente um desejo acobertado de sabedoria, de
que nada foi em vão.
Com tanto brilho saindo do olhar de agora, prevejo que tenha de usar óculos escuros para não ofuscar outras faces. Estendo, dia após dia, os pés para fora da cama, inundado de uma interminável manhã, e contemplo meu próprio despertar. Arrebentei o casulo.
Com tanto brilho saindo do olhar de agora, prevejo que tenha de usar óculos escuros para não ofuscar outras faces. Estendo, dia após dia, os pés para fora da cama, inundado de uma interminável manhã, e contemplo meu próprio despertar. Arrebentei o casulo.