9 de maio de 2011

Accident comes, accident goes

E, com um piscar de olhos, o olho registrou o cabum. Página virada da história, essa que poderia ser tragédia ou uma comemoração intensa. Eu, que só senti minha cabeça girar, e tudo o mais se contorcia entre nós e o resto. De repente, tudo era resto de nós, a divisão acontecia.

Eles vão. Ignoram-nos solenemente, eles nos desejam seus risos e olhares de desdenho, sua reprovação. Nós aqui permanecemos. Braços cortados pelo singelo toque na manopla, pela pressão excessiva de um pé só. Ou somos vítimas da ação de vários pés em conjunto? É justo deixá-los direcionarem assim o nosso futuro?

Eu que pensei que a guerra cotidiana tivesse personagens mais terríveis. Somos todos protagonistas de um grande mosaico que não diferencia o politicamente correto do erro plástico. Em plástico nos envolvemos, metais retorcidos nos contornam. Somos todos peça da mesma inútil engenhoca agora.

Ouvimos zumbidos, ligações e celulares. Vozes vem, vozes vão. Com um piscar de olhos, menos ainda, talvez, os ouvidos registraram o som surdo, o impacto dos ossos, o fisgar da fibra que nos segurava. Para que? É a pressa cotidiana que nos promove dessa maneira? E de tanto querer chegar acabamos destinados a lugar nenhum. É um ensinamento oriental? Queríamos apenas a perfeição?

Ferragens vem, cacos de lanternas se vão. Lágrimas de poucos, converter-se-ão no pesar de muitos. Sangue derramado entre nossos brinquedos, inocentes brincadeira essa que nos pôs em movimento. Movimento demais. Movimento demais? Sirenes e luzes brilhantes em minha pupila dilatada, não sei se ainda enxergo. Ouço as vozes, a contestação, os “meus deuses”, mas não sei de onde vem. E de repente não sei mais onde fomos parar. Cruzamos algum portal?, por que todo esse desconforto?

O tato vai-se. Rompeu-se alguma fibra, por um mistério o impulso eletrônico foi impedido de percorrer o caminho que sempre fizera desde... Desde muito antes de eu tomar a consciência das mãos, dos pés. Perdi a consciência, essa? Ou perdemos as mãos, essas partezinhas a que quase nunca dedicávamos nossa atenção? De que me adiantaram os cremes rejuvenescedores agora, oh pai?


Acidentados chegam, acidentados se vão. Pelos olhos do outro somos apenas dados estatísticos agora. Finalizamos nossa função.




2 comentários:

Mairex disse...

Que texto lindo, cheri. Como você é engenhoso para escrever! Nunca perde a referência ao título!
Confesso que a foto no final do texto me fez pensar duas vezes em voltar para GO de carro!
Um beijo enorme.

Neide Barros disse...

Lindo texto. Como sempre.