16 de setembro de 2008

Noite inesperada com amigos

Um convite inesperado (ou talvez nem tanto assim) depois da missa dominical das oito da noite. Aceitaram. Lá foram eles, quase em bando, para o local determinado. Mas pouco a pouco a noite se transformou em madrugada, o frio chegou e então foram embora. Apenas os mais determinados resistiram. (Isso, obviamente, é força de expressão.)

A conversa já ia animada, mas dobrou-se a empolgação quando um café foi anunciado. Ainda que não houvesse água na torneira da pia da cozinha, isso não era problema. Desceriam nem que fosse até ao córrego que havia perto (havia mesmo, ou era apenas impressão?) para pegar a água e garantir o preparo da bebida que garantia conversa. Ou na velha linguagem interiorana que ele tanto adorava, prosa mesmo.

Mudaram de local três vezes. Da calçada pra cozinha, da cozinha pro quintal, desse de volta para a calçada. Conversavam relativamente alto para ficarem ao fundo da casa, impedindo os demais habitantes de terem o sono merecido. A calçada era uma boa opção: fora recentemente lavada, e a visão da rua era muito aprazível, apesar de que a vista à esquerda carregasse um quê de misteriosa. A cada mudança a garrafa de café, o maço de Marlboro e o de Hilton longo eram carregados com importância quase religiosa. Mas de fato, só eles sabiam a importância de um cigarro e um gole (muitos, muitos) de café durante uma madrugada com amigos.

O assunto rendeu. Veio e foi muitas vezes, passou por diversas vertentes (que, ao menos pelo primeiro julgamento, nada tinham a ver uma com a outra). Vestibular, vida na universidade, doutrinas religiosas, interpretações bíblicas, existência de vida extraterrestre inteligente, e até mesmo o porquê de se fumar Marlboro.

É de se lembrar que, infelizmente, nem mesmo as noites com amigos (provavelmente o tipo mais nobre de noite existente) deixam de sofrer a implacável ação do relógio. E assim sendo, a conversa, que fluía natural e livre como a água do (possível) córrego próximo, foi cortada pelo despertador do celular dele, que avisava insistentemente as “cinco e meia da manhã” que chegavam, normalmente o horário em que ele acordava (ou ao menos tentava) para ir pra faculdade.

Entraram no carro, sem não antes ajudarem a carregar cadeiras e copos para dentro de casa e se despedirem, girou a chave e ouviu-se, provavelmente por toda a rua que ainda, timidamente, acordava naquela segunda-feira nascente, o ruído do motor do velho e companheiro Fusca verde. Pisou fundo o acelerador e viraram a esquina, deixando para trás apenas lembranças e o agudo som da engrenagem do carro, que foi enfraquecendo cada vez mais, até se tornar inaudível.

Ele a deixou em casa e seguiu, afobado, para a sua. Precisava arrumar o material, dar um jeito no rosto e descer para o ponto do ônibus, nos vinte minutos restantes. Ainda que esse detalhe o preocupasse um pouco, nada se comparava à sensação de tempo bem aproveitado, que valia mais que uma semana de ostracismo, que valia mais que duas horas no cinema. Mais que uma sessão da psicóloga. Um convite inesperado para se passar uma noite com amigos: não tinha um valor capaz de ser compreendido, pensava ele enquanto guardava o Fusca na garagem.

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